Comunidade do Rola-Moça alerta para risco de mineração na área ambiental
Moradores cobram mais transparência no processo de descomissionamento de barragens ao redor da unidade de conservação

A Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) realizou uma audiência pública na qual o principal tema foi o receio de uma possível retomada da mineração no Parque Estadual da Serra do Rola-Moça.
Durante o encontro, que ocorreu nesta terça-feira, 6, moradores da região cobraram maior transparência no processo de descomissionamento de barragens localizadas no entorno da unidade de conservação.
Esse processo está previsto em um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado em 2023. [0] Em meio a dúvidas sobre a correção e a legalidade desse documento, os moradores exigiram sua suspensão e o fechamento imediato das barragens.
O TAC foi assinado entre a empresa Mineração Geral do Brasil (MGB), a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) e os Ministérios Públicos Federal e de Minas Gerais.
O acordo estabelece o desmanche das barragens B1 e B2 próximas ao parque e o transporte do material de rejeito através da construção de uma estrada que atravessaria a unidade de conservação (UC), sem a necessidade de licenciamento ambiental para cada etapa do processo.
Moradores e defensores da reserva ambiental suspeitam que o TAC seja uma estratégia para contornar a exigência de licenciamento.
O parque abrange uma área de 4.006 hectares, estendendo-se pelos municípios de Belo Horizonte, Brumadinho, Nova Lima e Ibirité, todos localizados na Região Metropolitana de Belo Horizonte.
A unidade abriga seis mananciais que são responsáveis pelo abastecimento de água de parte dessa região metropolitana.
A área se destaca por sua natureza exuberante, com vegetação típica do Cerrado, Mata Atlântica e Campo Rupestre Ferruginoso.
Além disso, possui uma fauna rica, com animais como o lobo-guará, a onça-parda, o cachorro-do-mato, o veado-campeiro, o carcará e diversas espécies de aves.
Mineração apresenta riscos à vida na região
Os participantes da audiência pública expressaram forte oposição à construção da estrada, que representaria grandes riscos para a fauna, a flora e os recursos hídricos da área.
Também condenaram a autorização para a retirada e o transporte dos rejeitos das minas, argumentando que essa ação significaria o retorno da mineração ao parque, o que contraria a legislação federal e a Constituição, que proíbem essa atividade em unidades de conservação.
Dados da Agência Nacional da Mineração (ANM), apresentados pelo ativista do Movimento Rola Moça Resiste, Guilherme Siqueira de Carvalho, indicam que as duas barragens contêm, juntas, 836 mil metros cúbicos (m³) de rejeitos.
O projeto executivo para o descomissionamento das estruturas prevê a retirada de 60 mil toneladas por mês ao longo de cinco anos, totalizando 3,6 milhões de toneladas, o equivalente a 1,28 m3.
No entanto, o volume previsto é 435.328 m³ maior do que o esperado, o que sugere a intenção de retirar material de mineração ainda presente na unidade.
O transporte do material envolveria a circulação de 1.715 caminhões por mês, cada um com capacidade para 32 toneladas.
A construção da estrada resultaria na remoção de toda a vegetação em uma faixa de 20 metros ao longo do trajeto.
Maria Clara Paiva Izidoro, ex-conselheira do parque estadual, alertou que a estrada aumentaria o risco de atropelamento e fuga de animais da unidade, além de facilitar o acesso de caçadores de animais silvestres.
“Faço um apelo, um clamor, para que a insanidade não suplante a humanidade”, declarou Maria Clara Paiva Izidoro.
A deputada Bella Gonçalves (Psol) também criticou a iniciativa. “Em vez de se fazer a recuperação e a entrega do espaço para ser incorporado ao nosso patrimônio ambiental, estamos vendo manobras que aproveitam desses momentos para fazer o escoamento do minério de ferro”, afirmou.
A deputada Lohanna (PV) observou que a retirada de rejeitos já foi utilizada em outras atividades de mineração como justificativa para retomar ou dar continuidade à exploração, como denunciado recentemente na Serra do Curral, em Belo Horizonte.
“O descomissionamento de barragens e a retirada de rejeitos foi uma luta muito grande nossa e agora a impressão que passa é que querem nos penalizar com esse TAC”, disse.
A deputada Beatriz Cerqueira (PT) também se manifestou contra a mineração na área ambiental. Ela argumentou que é uma falsa dicotomia contrapor desenvolvimento econômico à preservação ambiental, uma vez que, em muitos casos, a atividade minerária esgota os recursos naturais e gera empregos precários e perigosos.
O presidente da Comissão, deputado Tito Torres (PSD), defendeu a realização de concursos públicos para a contratação de mais fiscais para os órgãos ambientais, com o objetivo de impedir atividades ilegais ou prejudiciais ao meio ambiente. Ao mesmo tempo, ele defendeu os servidores do Poder Executivo, afirmando que eles "buscam o melhor para Minas Gerais".
Governo defende TAC, mas enfrenta oposição
Representantes do governo estadual defenderam a necessidade de cumprir o TAC, argumentando que se trata de um instrumento homologado pela Justiça.
No entanto, essa posição foi contestada pelos demais participantes da audiência, que ressaltaram que a legislação superior proíbe a atividade minerária no parque estadual.
A construção da estrada, conforme mencionado por diversos presentes, viola a Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), uma vez que o parque é classificado como Unidade de Conservação de Proteção Integral.
O diretor da Fundação Estadual de Meio Ambiente, Roberto Junio Gomes, explicou que a tentativa de acordo teve como objetivo evitar a demora na judicialização da questão.
Ele informou que, em 2016, a mineradora não obteve licenciamento para a atividade, mas, em 2021, conseguiu uma liminar para ampliar o prazo de descomissionamento das barragens de três para dez anos.
Segundo Gomes, o TAC acelera essa descaracterização. [0] Ele acrescentou que a retirada dos rejeitos visa promover a recomposição da topografia original da área degradada.
De acordo com o supervisor do Instituto Estadual de Florestas (IEF), Ronaldo José Magalhães, o Conselho Consultivo do Parque Estadual da Serra do Rola Moça tem participado das discussões sobre a melhor alternativa para o escoamento.
“A gente vai ter que aceitar esse impacto, que vai ser temporário”, argumentou. Ambos os representantes defenderam a construção da estrada e a retirada dos rejeitos como a melhor solução para o problema, argumentos que foram contestados pelos demais participantes.
A anuência do Ministério Público ao acordo foi alvo de amplas críticas. A conselheira do parque estadual, Camila Oliveira Magalhães Leal, considerou que o MP se afastou de seu papel fundamental de defensor da ordem jurídica, passando a atuar como intermediador para beneficiar empreendimentos de grande impacto ambiental.
“A comunidade não tem mais porta para bater quando o Ministério Público negligencia essa escuta”, lamentou Maria Clara Izidoro, questionando a validade do TAC, que foi assinado sem a consulta e aprovação da sociedade civil e da comunidade afetada.
Fechamento das Barragens é reivindicado
Houve um consenso entre os participantes da audiência em defesa do fechamento imediato das barragens, da suspensão do TAC e da utilização dos rejeitos para preencher as crateras já abertas pela mineração e para a revegetação da área devastada.
Além disso, foi sugerida a realização de uma auditoria externa e independente para analisar a proposta do termo de ajustamento.
A deputada Beatriz Cerqueira informou que as sugestões seriam encaminhadas à Procuradoria da República e anunciou a realização de uma visita técnica ao Parque Rola-Moça.
A procuradora Ana Carolina Nascimento solicitou que as informações fossem encaminhadas ao Ministério Público Federal, para que fosse analisada a possibilidade de suspensão do acordo.
Ela ressaltou que medidas governamentais sempre podem ser revistas quando se trata de garantir direitos ou benefícios à sociedade.
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